quinta-feira, agosto 26, 2010

Abraçado ao rancor

Comecei, ano passado, a fazer uma paródia do livro O anticristo, de Nietzsche. Parei porque vivo precisando suspender meus "projetos do espírito", como diria Mario de Andrade, para fazer outras coisas mais prosaicas. Não é um trataod filosófico, mas uma brincadeira, do ponto de vista de um cristão. O nome desse projeto é O Antinietzsche. Abaixo segue o primeiro capítulo, que se chama justamente "Abraçado ao meu rancor"


Nietzsche era de uma linhagem de pastores protestantes, incluindo o próprio pai, que morreu prematuramente. Na juventude, também pretendia seguir a carreira sacerdotal, tanto que chegou a se preparar para o ministério pastoral. Mas alguma coisa aconteceu, e hoje o bigodudo prussiano é dos pensadores preferidos entre ateus, tornou-se o filósofo da moda, cult, pop e faz suar frio uma boa parte dos cristãos de praticamente todas as denominações, ao menos os mais chegados ao exercício do pensamento – que provavelmente não são maioria, não. Também é verdade que alguns dos cristãos pensantes não suam frio quando são defrontados com a obra de Nietzsche; antes, fazendo uso do conselho bíblico de provar todas as coisas e reter o que é bom, encontram entre as linhas do filósofo, algo que se aproveite.
É verdadeira a afirmação de que Nietzsche se converteu; contudo, seu percurso foi contrário ao do que nós cristãos gostamos de valorizar: ele saiu de uma formação cristã protestante e embrenhou-se num “antiniilismo materialista pré-futurista e antepós-moderno” (eita ferro!) presente na base de muitos movimentos políticos e filosóficos que atravessaram o século XX e chega ainda bastante vigoroso – talvez mais do que nunca, a posteridade nos dirá – ao terceiro milênio.
Ao menos na obra O Anticristo, Nietzsche é bastante contundente, mesmo agressivo, em suas afirmações. Contrariando o princípio cristão de oferecer a outra face, pretendemos aqui revidar os golpes proferidos pelo filósofo mais famoso dos últimos tempos – o de todos os tempos continua sendo Sócrates, “seguido pelos seguidores” Platão e Aristóteles, pelo espanhol Vicente Matheus e pelos brasileiros Xico Sá e Nataniel Jebão.
A presente obra não é um tratado filosófico. Minha deformação é outra. O próprio bigodudo me viria com profundo desprezo, pois, apesar de não ser teólogo, estou “envenenado” pela visão cristã de mundo. Mas, embora este fato me descredencie diante de muitos pensadores, gostaria de confrontar algumas ideias nietzschianas com meus princípios. Assim como o prussiano não podia se livrar de suas lancinantes dores de cabeça, não posso me desvencilhar do que sou: cristão, protestante, batista, evangélico e santista fundamentalista, mais ou menos nessa ordem.
Para mim, digo desde o começo, O Anticristo é fruto de um grande rancor, misturado com um enorme sentimento de inferioridade e traspassado por uma visão imperialista de mundo. Também deve haver algumas pitadas de traumas pessoais, fora o lado “noia” do filósofo, que não pretendemos levar em conta, dado seu viés especulativo. Não nos interessa a biografia do filósofo, apenas as ideias que defendeu. Desejamos não apenas matar a cobra, mas também, e sobretudo, mostrar a cobra morta!

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