segunda-feira, janeiro 31, 2011

Versos Menstruados?

Também achei o título de péssimo gosto. Por que, meu Deus, falar de poesia feita por mulheres tantas vezes exige um tratamento que a diferencia da obra produzida por homens, como se elas constituíssem uma classe separada e, direta ou indiretamente, considerada menor? Não sou lá muito fã de Cecília Meireles, mas sei que ela é poeta das que não deve nada, com alguns textos memoráveis. O que dizer de Adélia Prado, a que arranca poesia divina com aparente simplicidade e deveras intrigante da observação de um cotidiano que para o resto da humanidade só pode resultar em tédio? E aquela que é o verdadeiro motivo desse texto, a musa Alice Ruiz S? Aliás, esse S final é novidade para mim...
Folheei ontem uma coletânea dos poemas publicados por Alice Ruiz S na década de oitenta, lançada pela Iluminuras. Fazia tempo que eu não lia poemas. O efeito foi tão significativo que apenas com a pequena folheada – não comprei o livro por questões orçamentárias – não só me reencantei como arrisquei rabiscar alguns versos inspirados na poeta.
Não posso deixar de comentar que muitos poemas me lembraram o traço característico de Paulo Leminski, com quem Ruiz foi casada; contudo, é impossível saber quem influenciou quem – creio mesmo que a troca entre eles foi recíproca, pois não existe casal cujos cônjuges sejam imunes um ao outro.
Se a poesia de Alice Ruiz S é essencialmente feminina, para mim pouco importa, assim como não sou caçador de poesia masculina. O que me atraiu naqueles versos, os que pude ler e apreender – para o mês, se sobrar algum, compro e me esbaldo no livro – foi a certeza de que ainda existem poetas que dão sentido aos seus versos para muito além das teorias semióticas, pragmáticas e gerativas. Ainda é possível escrever poemas que sejam poesia, que podem ser lidos e admirados por leitores não especializados, justamente naquele lugar onde o verso realmente faz sentido e se justifica: longe dos gabinetes de professores universitários e do colo dos acadêmicos. Aos especialistas cabe apenas apreender e esmiuçar as estruturas das obras, sem com isso esvaziá-las da vida que as faz existir. Poesia, poema, poeta – seja homem, seja mulher – não foram feitos para acinzentar gabinetes; existem para epifanias e encantamentos, para indicarem a beleza e denunciarem o que realmente é feio.
Mas, devemos afirmar, com a beleza da contradição, é raro encontrar um homem que entenda tão bem de beleza quanto as mulheres enfronhadas na poesia...

terça-feira, janeiro 25, 2011

O último show?

Por muitos anos, se alguém me perguntasse qual era a minha banda de rock favorita, eu não hesitaria em dizer Titãs. Desde os dez anos enfeitiçado pelas canções do sempre citado em qualquer lista dos discos mais importantes da música brasileira Cabeça Dinosssauro, passando pela sua, ao menos na minha cabeça, sequência Jesus não tem dentes no país dos banguelas¬, que eu sempre escutei e entoei de uma perspectiva cristã, pensando que Jesus, era Deus e se fez homem, andou com pobres, prostitutas, loucos e marginalizados em geral, se fez de fraco para com os fracos etc., então seria normal se fazer de banguela para os banguelas. Na minha cabeça cristã, a única canção que gerava algum desconforto era mesmo igreja, que eu cantava, sim, mas mudava indiscretamente a letra para não sentir remorsos eclesiásticos.
Durante algum tempo eu acreditava ser o fã nº 1 dos Titãs, por saber todas as músicas a partir do Cabeça Dinossauro, por ter todos os discos – alguns em fita cassete, é verdade – e por ir aos shows sempre que podia. Por sorte, moro próximo ao SESC Interlagos, que foi e ainda é palco de alguns grandes artistas brasileiros – por anos o programa Bem Brasil, da TV Cultura, foi gravado no SESC Interlagos, aliás, em sua fase mais glamourosa. Ali, assisti a mais de m show da minha banda favorita.
Desconfio também que assisti ao último show dos Titãs em São Paulo com a formação clássica, ainda com Arnaldo Antunes. Foi em um show gratuito no Vale do Anhagabaú, se não me engano no aniversário de 100 anos do viaduto do Chá. Na mesma noite tocaram Lecy Brandão e Morais Moreira. Foi no mesmo ano do massacre dos presos no Carandiru, para quem Arnaldo dedicou a canção Porrada.
Depois vi os lançamentos dos discos Titanomaquia, o mais porrada de todos, influenciado pelo grunge que estava na moda – e também pelo produtor Jack Endino – e Domingo.
Os titãs me traduziam. As canções tinham a pegada furiosa nas melodias, nos riffs e nas letras, mas também tinham uma preocupação estética que não se via em qualquer banda. Após o esplendoroso sucesso do Acústico deles – formato que ainda não estava depauperado pela força da grana que ergue e destróis coisas belas – eles entraram numa fase que não acompanhei muito. As coletâneas, as versões e a volta para o estilo mais romântico dos dois primeiros discos, mas sem a graça new wave de outrora, já não me agradavam. Quando parava para ouvir os Titãs, me detinha nas músicas do Tudo ao mesmo tempo agora, disco deles que mais escutei, e nos já citados. Acompanhei de longe as experiências solo de alguns deles, virei fã incondicional do Arnaldo Antunes – eu queria ser Arnaldo Antunes – e curti muita coisa do Nando Reis, antes e depois de sua saída da banda. Li os dois últimos livros do Tony Bellotto; tive até o privilégio de ser um dos revisores de seu No Buraco, lançado em setembro de 2010, mesmo mês em que me casei.
Aliás, lendo No Buraco e mais alguns textos do Tony publicados no blog da Companhia das Letras, além de uma entrevista que ele deu no Estadão, fiquei com a impressão de que os Titãs já estavam no passado. Tudo, nas palavras do guitarrista e escritor, faziam crer que ele estava com muita vontade de abandonar a vida de rockstar e dedicar-se a algo mais compatível com a sua idade – ele acabou de completar 50 anos, idade em torno da qual todos os titãs gravitam. Parece que ao menos Tony anda percebendo que o corpo, apesar de bem conservado, ainda é pouco. E apesar de já não ser um fã tão ardoroso da banda, de já não conhecer todas as canções, me entristece a proximidade do fim. Sim, todo carnaval tem seu fim, mas o que vem depois, às vezes não passa de picaretagem, seja ela barbuda ou colorida.
Hoje, 25 de janeiro de 2011, o pulso ainda pulsa, e teremos Titãs ao vivo no SESC Interlagos. Provavelmente não irei, pois estou atolado em compromissos inadiáveis. E também porque sei que é cedo ou tarde demais pra dizer adeus.

quinta-feira, janeiro 20, 2011

Ode elegíaca a Saramago

No meio de um mar atlântico
(h)ouve um barulho:
O luto

Salgado pelas vidas
Que se foram vãs
Faladas e açoitadas
Esquecidas e escarradas
Por línguas várias
(o lusitano é irmão do mundo)

Mas da pétala de luz embriagada
Que ao olho turvo escapa
Semeia por mares e ares
O lúcido desejo:
Que a vida seja justa, limpa e sã
***
Enquanto isso, o Deus dos ateus
Pensa na vida que poderia ter siso
E se foi

sábado, janeiro 15, 2011

Mãos à lama!

Quando essas coisas acontecem, não dá tempo de ficarmos chocados, alarmados, tristes ou petrificados. Se a poesia cabe em qualquer lugar, tem todas as utilidades, a retórica, não! Não façamos da tragédia ponto de partida para nossas veleidades. É tempo de ajudar como der, ajudar desesperadamente pela pressa, ajudar carregados da esperança de que podemos salvar vidas, resgatar sobreviventes, auxiliarmos no pontapé reinicial da vida, confortarmos os que choram. Não é tempo de retórica, de marketing pessoal ou de trabalhar a imagem. É tempo de dedicação integral ao próximo.
O que pode ser feito? Doe. Dinheiro, roupa, remédio. Doe seu tempo. Doe sua criatividade. Doe seu ombro. Busque os meios confiáveis de ajudar: eu conheço e recomendo a Visão Mundial, mas certamente há outros; só tome cuidado com os picaretas e não faça desse momento um meio de aplacar sua consciência consumista, hedonista, egoísta. A dor do outro precisa ser estancada, ela não é remédio para seus desvios!
Ore. Sei que nesses momentos parece que Deus está ausente, mas não foi Ele quem empurrou as pessoas para áreas impróprias para moradia. Peça a Deus que nos capacite, que capacite os que podem ir, que capacite os que podem doar, e saiba que Ele intercede sim, pelos que sofrem, pelos que choram. E que, mesmo sendo um Deus misericordioso, cobrará a fatura dos responsáveis pelas tragédias agendadas que temos no Brasil, como as enchentes que a cada ano resolvem abocanhar uma região do Brasil. Serra Fluminense agora, Angra dos Reis, Niterói e São Luis do Paraitinga ano passado, Santa Catarina ano retrasado, e sempre bairros paulistanos, cidades mineiras... alguém há de pagar.
Incomode. As pessoas ao seu redor precisam se dar conta de que algo gravíssimo está acontecendo e que pessoas precisam de auxílio urgentemente. Tente convencê-las pela compaixão. Eu, que sou diabético e insulinodependente, estou preocupadíssimo com os diabéticos sem remédio que estão isolados na Serra Gaúcha. Um cardíaco talvez se importe com os cardíacos, seres humanos com seres humanos etc.
Cobre. A pressa para ajudarmos as vítimas é justificada e diante de vidas em risco, tudo deve ficar para depois. Contudo, as providências para que a versão 2012 das enchentes, inundações etc. não aconteça, devem ser tomadas a partir de agora. Pré-sal, Olimpíadas, Copa, tudo isso é lindo, mas só faz sentido se até lá não percamos milhares de vidas por conta da displicência de nossos governantes.
Corra! O que você pode fazer exatamente agora para ajudar as vítimas? O quê? E mais o quê? Pés, mãos e coração na lama, vamos ver se, como dizia o apóstolo Paulo, podemos salvar alguns...

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